[Debian-br-gud-rs] Ubuntu: Adotar, Estender, Extinguir

Paulo Francisco Slomp slomp em ufrgs.br
Sábado Maio 9 15:22:37 UTC 2015


Ubuntu: Adotar, Estender, Extinguir

9 de Maio de 2015

Fonte: http://softwarelivre.org/portal/noticias/ubuntu-adotar-estender-extinguir

Por André Machado:

Muito tem se falado a respeito da distribuição Ubuntu ultimamente. Não apenas eu, no ano passado, expressei minha opinião http://www.andremachado.org/artigos/1045/ubuntu-inimigo-no-1-do-software-livre-no-brasil.html sobre a mesma avisando que ela era nociva à nossa liberdade de software como, neste ano, houve uma polêmica a respeito da presença do mesmo no Flisol, Festival Latino-americano de instalação de software livre http://www.revista.espiritolivre.org/por-um-flisol-sem-ubuntu.

Por um lado, os usuários mais ativistas do software livre acusam o sistema da Canonical de não respeitar as quatro liberdades fundamentais https://www.gnu.org/distros/common-distros.html e coletar dados de seus usuários, enviando tais informações aos servidores da Canonical e da Amazon. Por outro, muitos usuários da distribuição colocam sua suposta facilidade de uso e a liberdade de escolha acima dessas questões.

Recentemente, eu tive uma epifania e pude visualizar o que está realmente por trás do Ubuntu e das jogadas comerciais da Canonical. Trata-se de uma estratégia desenvolvida por ninguém menos do que a Microsoft durante a década de 1990: o famoso Abraçar, Estender, Estinguir.

Essa expressão foi cunhada https://pt.wikipedia.org/wiki/Adoptar,_estender_e_extinguir pelo departamento de justiça dos EUA para descrever ” sua estratégia de lançar produtos envolvendo padrões amplamente usados, estendendo esses padrões com funções proprietárias e incompatíveis e então usar essas diferenças para por seus concorrentes em desvantagem”. De acordo com a Wikipédia em inglês, a estratégia se divide em três fases https://en.wikipedia.org/wiki/Embrace,_extend_and_extinguish#The_strategy:

    Adotar: é desenvolvido um software amplamente compatível com um produto competidor ou com um padrão público;
    Estender: São adotados e promovidos novos recursos não suportados pelo produto concorrente ou que não fazem parte do padrão, criando problemas de interoperabilidade para os clientes que tentarem usar o padrão original.
    Extinguir: Quando esses novos recursos se tornam um padrão de facto devido à parcela de mercado dominante, eles marginalizam os concorrentes que não utilizam essas extensões.

O exemplo mais gritante foi a Guerra dos Browsers, ocorrida no final dos anos 1.990: após não conseguir promover sua versão proprietária da Internet, a The Microsoft Network, a empresa adotou publicamente a World Wide Web. Logo em seguida, porém, ela estendeu a linguagem HTML padrão ao criar os controles ActiveX e algumas tags e sintaxes que só funcionavam no navegador Explorer, causando desvantagens aos usuários de Netscape. No início da década de 2.000, este concorrente foi extinto, o Explorer era considerado o navegador padrão e os padrões web haviam sido esquecidos, até o surgimento do Firefox, que quebrou o ciclo.

Uma estratégia similar pode ser observada com o Ubuntu e seu ecossistema. Senão, vejamos:

Abraçar: Em 2.004, surge a Canonical e o seu sistema operacional, o Ubuntu, que nada mais era do que uma remasterização do Debian com um tema próprio. Através de seu slogan de “Linux para seres humanos”, de sua promessa de ser sempre gratuito e do envio sem custo de CDs a qualquer parte do mundo, o Ubuntu conquistou uma legião de usuários e de desenvolvedores.

Estender: Em 2.010, o tema padrão do Ubuntu deixou de ser marrom alaranjado para se tornar roxo, o que muitos acreditam simbolizar uma mudança do lado comunitário para o comercial. Desde essa mudança, a Canonical implementou várias mudanças exclusivas para o seu sistema, dentre as quais podemos destacar: a plataforma de colaboração de softwares Launchpad e seus PPAs, seu próprio servidor de janelas, o Mir, seu próprio ambiente desktop, o Unity, seu próprio gerenciador de inicialização, o Upstart e, agora, seu próprio formato de pacotes, o Snappy http://br-linux.org/2015/01/canonical-vai-ter-versao-do-ubuntu-trocando-os-pacotes-deb-pelos-pacotes-snappy.html. Tudo isso, claro, com a desculpa de estar fazendo algo melhor e inovador, ao invés de tentar melhorar o que já existe.

Extinguir: Com uma grande comunidade tanto de usuários quanto de desenvolvedores, o Ubuntu se tornou o padrão de facto do mundo SL/CA. A maioria dos blogues “especializados” em Linux considera que seu leitor está ou estará usando Ubuntu para seguir algum tutorial – mesmo que o assunto em questão seja algo genérico, como a reinstalação do GRUB – e vários projetos de software livre ou migraram para o Launchpad ou só possuem versão binária disponível como PPA, dificultando a vida de quem deseja usá-los em outra distribuição (incluindo, aí, o Debian).
Onde eu quero chegar?

Se você, leitor, se despir de seu preconceito, perceberá que falta muito pouco para a Canonical ter um sistema independente: ela só precisa criar seu próprio userland – ferramentas de linhas de comando que acompanham o kernel – e, talvez, sua própria suíte de escritório, visto que o kernel Linux que acompanha a distro, muitas vezes chamado de “kernel Ubuntu”, quase pode ser considerado um projeto independente devido à grande quantidade de patches que recebe.

Mas e daí, pergunta você, qual o problema disso tudo? O problema é que, a cada dia, o Ubuntu está se tornando cada vez mais independente e, dessa forma, marginalizando as outras distribuições existentes. Mais do que isso, um belo dia a Canonical poderá resolver fechar seu sistema – da mesma forma que a Google fez com o Android – e acabar aprisionando seus usuários. O mesmo pode ser dito do systemd.

Voltando ao exemplo da Internet, uma vez que o concorrente é extinto, a inovação cessa. O Internet Explorer ficou anos na mesma versão, sem inovação alguma, até que chegou um concorrente para lhe tirar de seu trono. Seria esse destino uma bela ironia aos usuários noobs que enchem o saco dos veteranos repetindo o enjoativo mantra de que “não podemos parar a inovação”? Fica no ar, a dúvida.

Fonte: andremachado.org http://www.andremachado.org/artigos/1322/ubuntu-adotar-estender-extinguir.html


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Paulo Francisco Slomp
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